quarta-feira, agosto 03, 2011

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Ana Paula permanecia de costas para Fernando quando sentiu a sua mão gelada no ombro, aos poucos foi-se voltando e percorreu-o com o olhar de baixo para cima. Chinelos de cabedal pretos, calças de ganga azul muito claro, t-shirt branca decote redondo, óculos de sol pretos quadrados, cabelo curto. Quando lhe fixou a boca, Ana Paula sorriu, que bem desenhada, pensava ela.
- Vamos para dentro? – pergunta Fernando deslizando a mão do ombro até à mão de Ana, puxando-a antes que ela respondesse.
A porta de entrada é encerrada ficando os dois no hall de entrada, azulejos forravam as paredes em tons de azul enquanto o chão era em largos mosaicos de granito preto. Sentia-se o fresco da noite começava a chegar.
Fernando continua puxando Ana Paula até ao Oásis, um pequeno jardim coberto com uma decoração muito própria.
-Vou buscar o chá gelado, gostas não é?
- Fernando por favor em vim aqui para falar contigo, não para beber chá gelado!!! – Ana Paula continuava ansiosa. Mas Fernando não a tinha deixado acabar a frase e quando ela olhou em volta, já ele não estava. Sentou se num cadeirão macio, largo, ficando quase deitada, fechou os olhos e respirou fundo. Confortável, pensou Ana Paula reclinando-se ainda mais, esticou o corpo e ficou com as pernas a tocar no cadeirão da frente, as mãos seguravam o corpo e tocavam num tecido macio e confortável, no ar sentia-se o cheiro das velas de canela e baunilha, parecia que Fernando se tinha lembrado de tudo o que ela dizia que gostava. Estava ansiosa, mas sabia que não podia estar a adiar mais. Reclinou-se ainda mais no cadeirão, tirou as sandálias e ficou com os pés meio em cima do que estava em frente dela. Abriu os olhos e pensou o que seria feito de Fernando, nunca mais chegava. O telemóvel tocou, puxou a mala que estava no chão para o colo dela e de olhos fechados atendeu-o
- Sim faz favor – diz Ana Paula com sua voz rouca – não estou no consultório o resto do dia é verdade. Pode marcar com a Joana, não tem problema. Mas se sente pior o melhor é reforçar a dose do ansiolitico está bem? Ligue-me quando necessitar, Beijo
Fernando estava parado à porta a observar Ana Paula, ela tinha atendido o telefonema de olhos fechados, toda esticada no cadeirão com os pés a tocar o que estava à sua frente. Ana Paula estava de saia comprida, sandália de couro, top preto, muito simples, destoava o porta-chaves Mont Blanc que usa preso à sua mala Marc Jacobs, que estava no seu colo.
- Problemas? – perguntou Fernando pousando a bandeja que trazia como chá
- Não, está tudo bem, era um doente que queria alterar o dia da consulta e como as chamadas estão a ser reencaminhadas para o meu telemóvel, atendi. Não queria que fosse para casa. Melhor assim.
Enquanto falava Ana Paula coloca-se direita na cadeira, Fernando depois de pousar a bandeja sentou-se à sua frente e segurou-lhe nos pés para ela os colocar em cima das pernas dele.
- Que parvoíce Fernando, então!!! – Ana estava visivelmente nervosa com a atitude de Fernando.
-Relaxa por favor, quero que estejas em paz –
Serviu o chá com uma mão apenas e com outra segurou nos pés de Ana Paula, para elas não os retirar do seu colo.
O chá estava óptimo, cheio de gelo para trincar como Ana adorava, meio amargo e forte, obrigando-a a sair da letargia em que estava a entrar naquele fim de dia demasiado peculiar.
- Fernando ainda não falamos nada - diz Ana Paula ansiosa,
-Não temos nada para falar - responde Fernando meio a sorrir. Sentia-se feliz, esvoaçando nas hélices da cadeia de ADN, como dizia Ana Paula.
Os dois frente a frente, quatro anos depois do primeiro telefonema, já se tinham rido e chorado muito, Mas nunca se tinham visto olhos nos olhos.
O telemóvel tocou novamente, Ana Paula recostada no cadeirão copo do chá numa mão, olhos fechados, outra mão esticada procurando a mala no chão. A mão entra na mala, tira o telemóvel e atende.
- Sim.!!! – atende Ana Paula meio a rir e sorrir. Salta e fica sentada na cadeira – Olá, tudo bem contigo? Estou na casa de um paciente. Não disse porque era urgente. Volto para jantar sim, obvio. Até já querido. Desligou o telemóvel meio pálida, não era normal João Carlos ligar-lhe durante o dia, normalmente ele era tão ou mais ocupado que ela. Longe iam os dias em que ele se recordava e que ela se aninhava no silêncio da noite no amor dos dois. Sem arte nem engenho a rotina tinha chegado no meio de um amor enorme que tudo tinha para dar certo. Ana Paula adorava João, adorava de coração, tinham vivido uma historia de amor lindíssima, encontros e reencontros numa praça antiga já sem coreto, mas onde a banda filarmónica se ouvia todos os dias.
- Vou me embora Fernando, tenho de ir
- Ana eu não sei o que querias que eu falasse contigo, está tudo como estava, agora apenas tenho a certeza, existes mesmo. – a voz de Fernando estava tremula, e Ana via as lágrimas a escorrerem-lhe pela face.
- Fernando eu não te prometi nada, não vou escolher, tu sabes
- Sei querida e é por isso que a cada dia que passa te quero mais. Agora vai, voltarás.

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